Quinzinho e o fim de ano

Quinzinho enrolava-se lentamente na manta acolchoada. Era horário de verão, mas o frio lá fora dizia que devia ser uma outra estação prestes a chegar. Gostoso era ouvir o mensageiro dos ventos tilintando lá fora e sentir o conforto morno de seu quarto aqui dentro.

Pensou nos cartões de natal que tinha mandado no mesmo dia. No ano anterior, mandara quarenta. Queria fazer todo mundo feliz, todos deviam se sentir importantes e lembrados e queridos. Neste ano, depois de tanta coisa, tanto rompimento, tanta decepção, tanta ausência... Foram sete. Mas sete bem escritos, para os sete que estavam lá, sempre. O que seria a amizade, afinal?

Ainda tinha uma semana sufocante de trabalho pela frente. Pilhas de papéis intermináveis nos quais queria desenhar, fazer origamis ou que podia simplesmente reciclar, já que não tinham qualquer utilidade. Mas não podia fazer nada daquilo. Suspirou fundo e se escondeu debaixo da manta. Se escondeu de quem?

Pensou em Lili. Por onde andaria? Seu coração andava distraído - se andasse, tropeçaria. Pensava nela às vezes, ela que tinha colorido seus dias cinzentos. Mas passava. Cada vez mais era uma imagem desbotada, enquanto outras iam ganhando cor. Entretanto, os contornos do rosto delicado de Lili e a leveza de seu ser e a doçura de suas palavars ficariam para sempre com ele. Levaria coisas boas do ano prestes a findar. E algumas não muito boas. E não seria sempre assim?

Tinha mil e um planos e (ainda) o mesmo sorriso bobo, o mesmo ar cativante, as mesmas mãos firmes, cheias de verbos e vontades. Era um homem de ação, sempre fora. Mas, agora, tudo o que mais queria era adormecer enrolado na manta morna e esperar o ano acabar, sem ter que pensar nas pilhas de papéis que o atacavam mesmo enquanto sonhava.

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